quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Como aqui chegámos


Imagem do blogue "Cristina Gonçalves"



COMO AQUI CHEGÁMOS


O PRIMEIRO CAMINHO:

O Clube Português de Autocaravanas (actual Associação Autocaravanista de Portugal – CPA) tem a respectiva génese aí por volta de 1988, numa reunião informal de alguns campistas e ocorrida num acampamento realizado nos arredores de Lisboa.

O conceito de autocaravanismo (que ainda não está definido por escrito) não se punha. Eram apenas campistas entusiasmados com os veículos autocaravanas, veículos que lhes permitiam acampar em condições melhores e mais autónomas. Veículos que muitos construiam com as próprias mãos, já porque as condições económico-financeiras a isso obrigavam, já porque à época o mercado de autocaravanas em Portugal era escasso ou practicamente inexistente.

Terá sido por tudo isto (nem eventualmente outro conceito lhes terá ocorrido) que estes fundadores do CPA denominaram a associação como sendo um clube de autocaravanas.

Um clube de autocaravanas (não de autocaravanistas) cujos estatutos vinculavam o CPA à Federação de Campismo e cujos conceitos e estrutura se baseavam no campismo.


O CAMINHO DA CONSOLIDAÇÃO:

Só com a Direcção eleita para o biénio de 2006/2007 (16 anos depois da constituição do CPA) se começa a evidenciar a necessidade de mudança que alguns sócios já vinham manifestando. Segundo esses associados o autocaravanismo devia ter um estatuto autónomo do campismo.

Mas, também porque já nesse período a discriminação negativa dos veículos autocaravanas se verificava, embora pontualmente, foi criado um grupo de trabalho no seio da Federação de Campismo, de que fez parte o CPA, para elaborar uma proposta legislativa sobre a matéria. Infelizmente surgiram divergências entre a Federação de Campismo e o CPA que esfriaram as aparentemente boas relações então existentes.

Foi também nesse mandato que começaram a surgir relevantes documentos sobre autocaravanismo e a realizarem-se, com alguma frequência, encontros autocaravanistas no exterior dos Parques de Campismo, a fazerem-se contactos com as Câmaras Municipais, a promover-se o apoio à implementação de Áreas de Serviço e a participação, de forma autónoma, na NAUTICAMPO. O CPA voltava-se para o exterior.

Mas, foi igualmente a partir desse mandato (2006/2007) que o CPA se estruturou internamente de forma mais profissional e se modernizou, designadamente com a informatização, a utilização da Internet e ainda na maior e melhor comunicação com os associados, dando-lhes inclusive voz. O acesso a um seguro do veículo autocaravana em condições altamente vantajosas foi, na época (e continua a ser) um contributo de importância decisiva para o crescimento da associação.

No entanto, o cordão umbilical estatutário com a Federação de Campismo mantinha-se e o CPA em termos de uma definição de política autocaravanista não campista não parecia ter uma actuação consistente.


O CAMINHO DO RECONHECIMENTO

O CPA deixa de ser um “clube de amigos” para passar a ser um clube onde os amigos se encontram e convivem.

É a partir do mandato iniciado em 2010 que as sucessivas Direcções do CPA veem progressivamente, sempre com o apoio dos associados expresso em Assembleias Gerais, a definir estruturalmente (veja-se a alteração profunda dos estatutos) uma política autocaravanista não campista, mas que também não foi e não é, anti-campista. Uma política que se pode resumir no seguinte:

O CPA é uma associação essencialmente vocacionada para o autocaravanismo que pratica a inclusão de todos os autocaravanistas independentemente do conceito que cada um tenha sobre a práctica da modalidade.

É neste âmbito que os acontecimentos se vão desenrolar centrados numa Declaração de Princípios subscrita pela Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal (FCMP), em que novos dirigentes da FCMP (que agora são osctuais) se candidatam com base num Programa Eleitoral no qual o autocaravanismo é apresentado como uma modalidade autónoma, em que o novo Presidente eleito da FCMP acompanha a Direcção do CPA nas inaugurações de Áreas de Serviço (equipamentos municipais), em que a FCMP promove um Encontro Autocaravanista e um Colóquio subordinado ao tema da defesa do direito à não discriminação negativa dos veículos autocaravanas, em que são alterados os Estatutos da FCMP, nos quais o autocaravanismo surge como uma modalidade e não como uma disciplina do campismo, em que no seio da FCMP é constituída uma Comissão de Autocaravanismo, com regulamentação própria e, nos próprios órgãos de comunicação da Federação são divulgados os valores do autocaravanismo e as bases de uma política autocaravanista consistente. Cabe aqui afirmar, sem falsa modéstia, que em todos estes acontecimentos o CPA esteve presente ao longo dos 6 últimos anos.

Neste período surge a FPA pela mão de 3 associações, tendo, até, uma das associações sido criada propositadamente para o efeito. Pelo menos três razões (entre outras inclusive de natureza mais pessoal) estiveram na origem da constituição da FPA: (a) a saída do CPA da FICM que fez com que alguns, desesperadamente, corressem, ainda antes da constituição formal da FPA, a ocupar na FICM o lugar abandonado pelo CPA ; (b) a recusa de integrar uma plataforma inorgânica formada por todas as associações de base vocacionadas para o autocaravanismo e (c) o desconhecimento da realidade social autocaravanista que fez os fundadores da FPA sonhar que acorreriam à nova federação alguns milhares de associados. Infelizmente (para os construtores de uma FPA anti-CPA) esta convicção não se concretizou e, presentemente, não aderiram à FPA mais clubes, nem sequer a quantidade de associados dos clubes aumentou, antes pelo contrário.

As Direcções posteriores a 2010 sabiam que o CPA não tinha total capacidade para isoladamente combater a discriminação negativa do veículo autocaravana e que qualquer legislação que fosse proposta viria negar o direito de pernoita aos autocaravanistas. Também aqui a FPA abriu a Caixa de Pandora ao propor medidas legislativas cujos objectivos nunca foram factualmente expressos e que abriram caminho às ideias de alteração da legislação que a CCDR-Algarve anunciava como imprescindível. Com a força que lhe advinha de ser uma entidade que oficialmente tutela o autocaravanismo a FCMP veio, para também obstar a esse aventureirismo legislativo, divulgar publicamente que não se tornavam necessárias mais leis, pois que as existentes eram suficientes.

O CPA que procurava divulgar e racionalizar os objectivos políticos de combate à discriminação negativa do autocaravanismo conseguia, a nível nacional, ter na FCMP um aliado institucional poderoso e, a nível internacional, o apoio da Federação Internacional de Campismo, Caravanismo e Autocaravanismo.

Porém, nunca é demais repetir, ao longo desse período de 6 anos o CPA nunca deixou de pugnar pela constituição de uma plataforma inorgânica congregando as associações de base vocacionadas para o autocaravanismo, procurando o diálogo e participando (até para criar pontes) nos eventos dessas associações, sempre que convidado. Não o fazia porque e para que dessa plataforma pudesse vir a obter dividendos próprios, mas porque os interesses do autocaravanismo aconselhavam que se alcançasse esse propósito de unidade na acção.


O CAMINHO DA DIGNIDADE E DO RESPEITO:

Nos finais de Junho deste ano, sem qualquer diálogo com o CPA, sem qualquer informação prévia, em segredo, a FCMP foi recebida em audiência na Assembleia da República, onde propôs alterações legislativas contrárias a toda a política autocaravanista que tinha publicamente assumido e, inclusive, se comprometido.

O teor da audição, patenteada num vídeo divulgado no Portal da Assembleia da República, é deprimente e ficámos a saber que a FCMP também já tinha junto do Governo feito idênticas propostas legislativas.

Não está em causa, apenas, o teor das propostas de legislação e o absurdo que resultaria da aplicação integral das mesmas, mas, também, a postura e a acção, criticável, dos dirigentes da FCMP

O CPA é ostensivamente empurrado pela FCMP para a saída.

Será, ainda, possível os sócios do CPA manterem-se na FCMP? Muito dificilmente, pois está em causa a dignidade e respeito que há que manter perante a atitude da FCMP. Mas, afirmo, é possível o CPA manter-se na FCMP. Tudo depende do Presidente da Federação de Campismo (ou de outro representante da FCMP) que se comprometeu a participar na Assembleia Geral do CPA, para (digo eu) dar as explicações que possam justificar (se é que isso é possível) as propostas legislativas que fez..

Os sócios do CPA seguramente irão votar favoravelmente, na Assembleia Geral do próximo dia 19 de Novembro, a saída da FCMP, por este ser o único caminho, o caminho da dignidade e do respeito, que temos que ter por nós próprios.

Para memória futura e para a história do autocaravanismo em Portugal que fique registado que a cessação da filiação da Associação Autocaravanista de Portugal – CPA na Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal será única e exclusivamente da responsabilidade dos dirigentes desta federação.



(O autor, todas as Quintas-feiras, no Blogue do Papa Léguas Portugal, emite uma opinião sobre assuntos relacionados com o autocaravanismo (e não só) - AQUI)

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