quinta-feira, 26 de abril de 2018

O Sr. Alfredo, os restaurantes e os Clubes Autocaravanistas



Imagem obtida no Blogue “Lições de Vida”




O Sr. Alfredo, os restaurantes
e
os Clubes Autocaravanistas



Há uns anos atrás almoçava regularmente no restaurante do Sr. Alfredo, situado algures num conhecido bairro lisboeta. Era o único restaurante na zona, mas, felizmente, comia-se razoavelmente bem. Talvez por isso, devido à simpatia do Sr. Alfredo, e também, como já referi, por ser o único restaurante nas proximidades, os clientes fidelizavam-se.

Um dia cheguei ao restaurante mais tarde do que o habitual, encontrando-se a sala já vazia. O Sr. Alfredo e a esposa (que também era a cozinheira) e o único empregado que tinham (que ao que parece era sobrinho) não obstante já se encontrarem a almoçar numa mesa afastada, não deixaram de me atender e servir-me uma, por sinal ainda me recordo, excelente refeição.

Terminado o almoço o Sr. Alfredo veio sentar-se à minha mesa e presenteou-me com um bagaço especial, daqueles que só se oferece à família mais chegada e aos amigos. Também foi a primeira e única vez que o fez, com grande pesar da minha parte, até porque não tive coragem de, ao longo das vezes que ali continuei a almoçar, o pedir.

É evidente que, naquele almoço, beberricando aquele bom bagaço, trocámos algumas palavras, tendo ficado surpreendido com os conhecimentos (de experiência feitos?) do Sr. Alfredo. Em dado momento atrevi-me a comentar que ele devia estar muito satisfeito por aquele ser o único restaurante da zona, por não ter concorrentes. E foi aí que o Sr. Alfredo me surpreendeu. Que não, que não senhor. Ele gostaria de ter na zona mais dois ou três ou mesmo quatro restaurantes. Ora essa, disse-lhe eu, não tem medo que os seus clientes se dispersem, lhe fujam. Mas que não, respondeu ele. Haveria era mais clientes, pois as pessoas deslocam-se para onde há maior possibilidade de escolha. Por outro lado, havendo mais concorrência, teria cada um de se esforçar por prestar melhores serviços. Pois eu não via, dizia-me empolgado o Sr. Alfredo, que nesses bairros típicos onde há muitos restaurantes e tabernas, a afluência é muita? Mais do que se houvesse só um. E então nas zonas de restauração dos Centros Comerciais?! E continuou ele: - Mesmo à noite, estão cheios! E aqui? Alguém vem para aqui, há noite? Para um lugar deserto? E o Sr Alfredo terminou perentório: - Mais três ou quatro restaurantes é que era bom. Depois, após uma pausa, sentenciou: - Sem perder-mos as coisas de cada um, lá nos havíamos de orientar no que fosse bom para todos.

Alguns anos depois daquela conversa a minha actividade laboral deixou de se centrar naquela zona e deixei de almoçar no restaurante do Sr. Alfredo. Não sei se o restaurante ainda existe, não sei se o Sr. Alfredo ainda é vivo, mas nunca esqueci as palavras dele. As palavras de um homem que sabia como as “coisas” funcionam.

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Vem esta pequena história à coação porque as associações autocaravanistas de base e com personalidade jurídica há já tempo demais que continuam sem capacidade para analisarem em conjunto os problemas que se colocam ao Movimento Autocaravanista de Portugal.

Não se pode assumir que a existência de mais ou de muitas associações autocaravanistas é prejudicial, pois, como dizia o Sr. Alfredo, haver mais restaurantes fortalece a restauração, na medida em que a concorrência obriga a que cada um preste maiores, melhores e mais diversificados serviços.

O que prejudica o Movimento Autocaravanista de Portugal (as associações, os associados e os autocarravanistas em geral) é, sem que cada associação perca a respectiva identidade, não passar-se uma mensagem comum para o exterior do Movimento que permita criar condições para o desenvolvimento sustentado do autocaravanismo.

Vamos ao concreto:

As associações concordam que ACAMPAR é a imobilização da autocaravana, ocupando um espaço superior ao seu perímetro, em consequência da abertura de janelas para o exterior, uso de toldos, mesas, cadeiras e similares, para a prática de campismo? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que acampar só é permitido (e assim deve continuar) em locais consignados na Lei e, consequentemente, salvo exceções, também consignadas na Lei, é proibido na via pública, independentemente da hora a que ocorra, devendo, na salvaguarda do interesse público, ser penalizado? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que ESTACIONAR/PERNOITAR é a imobilização da autocaravana na via pública, respeitando as normas de estacionamento em vigor, designadamente o Código da Estrada, independentemente da permanência ou não de pessoas no seu interior? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que o ato de estacionar/pernoitar, conforme é acima definido, deve poder continuar a ser efetuado em qualquer local, não proibido por Lei (nomeadamente no Código da Estrada) não podendo as autocaravanas, pelo simples facto de o serem, nomeadamente através de sinalética que não conste de diplomas legais (e que será discriminatória se vier a existir), ser impedidas de o fazer? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que é lesivo da igualdade de tratamento a que todos temos direito a existência de diplomas que legislem de forma discriminatória, impedindo especificamente o veículo autocaravana de estacionar onde outros veículos de igual ou semelhante gabarito o podem fazer? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que o turismo itinerante em autocaravana é um fator de desenvolvimento económico para as populações que justifica em si mesmo uma discriminação positiva do autocaravanismo? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que os Parques de Campismo Municipais devem permitir a utilização das Estações de Serviço para Autocaravanas neles existentes, no âmbito de uma politica de proteção do ambiente e, consequentemente, a preços compatíveis com o serviço prestado (abastecimento de água potável e despejo de águas negras e cinzentas)? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

As associações concordam que a implementação de Áreas de Serviço para Autocaravanas, em pelo menos uma por Concelho, preferencialmente de iniciativa autárquica, contribui, não só para o desenvolvimento económico das populações, como para a proteção ambiental e o melhor ordenamento do trânsito automóvel? Se concordam, digam-no em conjunto, porque é minha convicção que os autocaravanistas estão de acordo.

Não se trata de uma obsessão afirmar constantemente que se as associações concordam o devem fazer em conjunto. Trata-se de dar força política a conceitos que já estão interiorizados no seio do Movimento Autocaravanismo Europeu, o que tem maior impacto se for transmitido conjuntamente, a uma só voz, pelas associações autocaravanistas de base e com personalidade jurídica.

Recordando, parafraseando as ideias do Sr. Alfredo, digo:

Sem perder as coisas de cada um, lutemos pelo que é bom para todos



(O autor, todas as Quintas-feiras, no Blogue do Papa Léguas Portugal, emite uma opinião sobre assuntos relacionados com o autocaravanismo (e não só) - AQUI)



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