Do cimo do seu caixote de madeira a Mulher da Banha da Cobra usava os seus dotes de propagandista para juntar as pessoas em seu redor e mantê-las atentas e interessadas. Depois, com as atenções já captadas, oferecia-lhes o famoso Bálsamo, a milagrosa Pomada, o fantástico Unguento ou, mais prosaicamente, a Massa de Curandeiro. Resumindo: A Banha da Cobra.
(Banha da Cobra: Era feita, quando o era, a partir de teriaga, uma exótica mistura de plantas medicinais com ópio e carne de cobra)
Esta pomada, assegurava a Mulher da Banha da Cobra, curava tudo e mais alguma coisa. Desde calos a pneumonias, de infertilidades a impotências, de dores de cabeça a faltas de apetite.
A Mulher da Banha da Cobra, depois de relatar as virtudes do produto e dar múltiplos “exemplos” de curas milagrosas e considerar que os ouvintes estavam “conquistados”, avançava para a venda propriamente dita.
O produto (dizia ela) era vendido quase gratuitamente… era, dizia com veemência, oferecido, porque só queria o bem de todos. O preço, esclarecia, não comprava uma só caixa de unguento, mas duas e, ainda, aos primeiros 20 compradores, pelo mesmíssimo preço, ainda oferecia uma outra caixa. Três caixas de pomada pelo preço de uma, dizia naquele tom de voz próprios dos feirantes. Só o fazia (continuava ela a proclamar), por gostar daquele bairro e das pessoas que ali viviam pois quase não ganhava nada ao “dar” 3 caixas pelo preço de uma. Mas, há mais, gritava a plenos pulmões a Mulher da Banha da Cobra: com as três caixas ainda oferecia um pente especial para o fortalecimento do cabelo, um pano único para uma boa aplicação da pomada e, ainda, a imagem do Dr. Sousa Martins, para que do além lhe garantisse a cura.
(As capacidades de curas miraculosas, que foram atribuídas ao Dr. Sousa Martins ainda em vida, estendem-se para além da sua morte. Sendo chamado a intervir, como se de um santo católico se tratasse, recebe os agradecimentos dos crentes que em datas de aniversário do seu nascimento ou morte, lhe prestam homenagem. Nessas ocasiões assistem-se a romarias, em Lisboa ao monumento de que falamos ou ao cemitério de Alhandra onde repousam os seus restos mortais, mantendo o culto vivo mesmo 120 anos após a sua morte a 18 de Agosto de 1897.)
Mas, nada era deixado ao acaso. Na assistência circulavam um ou dois parceiros a fingirem-se interessados e, no momento em que os basbaques pareciam hesitar e até desmobilizar, avançavam de peito feito para realizar as mobilizadoras (e fingidas) primeiras compras. Algumas vezes, enquanto compravam, falavam para os putativos compradores elogiando o produto, dizendo que não era a primeira vez que o usavam e que estavam quase curados da dor na perna, ou da tosse irritante, ou das cólicas intestinais ou de qualquer outra maleita.
E as pessoas compravam e compravam e compravam. Não só os que estavam doentes como os que se queriam prevenir de presumíveis futuras doenças. Porque, naquela época, não havia Serviço Nacional de Saúde e ir ao médico era só para ricos.
Esta técnica de vendas, não obstante ainda ser um adolescente, era fascinante.
Recordo, então já um jovem, assistir a uma técnica semelhante na antiga Feira Popular, no Pavilhão das Panelas, onde se sorteavam conjuntos de 6 e 8 panelas de diversos tamanhos.
Presentemente a mesma técnica de vendas é usada nas televisões generalistas portuguesas.
No pequeno écran vê-se um representante do produto a apresentá-lo acolitado por algum conhecido apresentador televisivo o que, de alguma forma, dá credibilidade ao produto. Depois, não é só uma caixa desse produto que é “oferecido, mas mais duas ou três pelo mesmo preço e, ainda, oferecem uma caneca ou um copo ou qualquer outra coisa. E aos primeiros 50 que ligarem para o número “x” ainda fazem um desconto.
Não, não estou a pôr em causa a qualidade dos produtos que assim são vendidos nas televisões, mas tão somente a comparar a técnica de vendas usada antes e a usada agora. Uma técnica semelhante à que se usava há uns 60 anos, embora adaptada à realidade tecnológica e à mentalidade do presente.
A substância da técnica de vendas mantém-se idêntica à do passado; a forma como se processa, actualizou-se.
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CRÉDITOS:
1ª Foto – Autor: Inteligência Artificial.
2ª Foto – Autor: Eduardo Portugal no espaço de “Lisboa de Antigamente”
3ª Foto – Autor: Desconhecido no espaço de “Ruas de Lisboa com alguma história”.
4ª Foto – Autor: Joshua Benoliel no Espaço de "Bic Laranja"
5ª Foto – Autor: Inteligência Artificial
6ª Foto – Autor: Desconhecido no espaço “Lisboa – Directório de Contactos”
7ª Foto – Autor: Mário Novais no espaço “Imagens com História da Wordpress”
8ª Foto – Autor: Desconhecido no espaço “Designe Culturetv”
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