quinta-feira, 22 de novembro de 2018

E FOI PRECISO IR A ESPANHA




E FOI PRECISO IR A ESPANHA

(Mini crónicas de uma viagem por Espanha)


Não é segredo para os habitantes do norte de Portugal e para os autocaravanistas que por lá circulam que os bois de uma raça especifica (aquela de chifres grandes) se deslocam sozinhos pelas estradas, num percurso que diariamente fazem entre os estábulos e as pastagens. É vê-los ao amanhecer a caminho das pastagens e, antes de anoitecer, naquelas estradas estreitas, em fila, pachorrentos, bamboleantes, de regresso aos estábulos.

Quando das duas ou três vezes que com esses bois me cruzei ou que à minha frente seguiam, tive o especial cuidado de não os irritar e de lhes dar total e completa prioridade.

Na região da Cantábria (Espanha) também existem bois, embora de uma raça diferente, que circulam nas estradas a caminho das pastagens (ou de regresso das mesmas) mas, aparentemente, conduzidos por um pastor (?).

A minha imagem de um pastor, talvez errada, reside num homem envergando uma grande e grossa capa, tendo na mão um grande pau, um grande cajado, e ao lado um bonito cão, atento às ordens do dono.

Para início desta história direi que conduzia a minha autocaravana na estrada entre Potes e Celis, descontraído, quando, pela frente, à saída de uma curva, se me deparou uma manada de uma boa dúzia de imponentes bois, ocupando toda a largura da estrada. Afrouxei, que remédio!

Quase de seguida aproximou-se um carro vermelho, pequeno, velho, cuja marca e modelo me não apercebi. Parou do lado contrário e dele saiu um homem que começou a gesticular e conseguiu que a manada prosseguisse encostada ao lado direito da estrada. Depois, regressou ao carro. Um cidadão simpático que quis facilitar o trânsito, pensei.

Dispus-me a a ultrapassar a manada, mas logo alguns bois voltaram a ocupar todo o espaço, impedindo-me a manobra. Entretanto, um autocarro, que vinha em sentido contrário, foi também obrigado a parar. Nesse momento alguns bois já seguiam ao lado da autocaravana. Disse de mim para mim, que a viagem ia ser muito lenta.

Mas, eis que de repente, o carro vermelho me ultrapassa a apitar estridentemente e o condutor a agitar energicamente um braço. Os bois, talvez devido ao som da busina e ao braço que se movia enérgico, lá se encostaram de novo à direita. De novo o condutor saiu do carro vermelho e mantendo os bois no lado direito da estrada proporcionou ao condutor do autocarro uma passagem fácil, embora lenta. Depois, tornou meter-se no carro e arrancou à frente da manada, deixando-a para trás. E de novo, para minha irritação, os bois ocuparam toda a estrada.

Após algum tempo, seguindo lentamente atrás dos bois, ainda tentei ultrapassá-los, apitando e agitando um braço, a exemplo do que vira fazer ao condutor do carro vermelho,. Não obstante alguns dos bois se encostarem à direita, outros houve, de maior porte e mais pachorrentos, que me ignoraram. Não passei.

Desesperado com a lentidão com que seguia preparava-me para estacionar, logo que possível, quando, a seguir a uma curva, lá estava o carro vermelho, no meio da estrada, com o condutor no exterior, aos gritos e, com gestos largos, a encaminhar os bois para fora da estrada em direcção a um caminho de terra batida. Depois, já com os bois fora da estrada, meteu-se no carro vermelho e seguiu na peugada da manada.

Foi a primeira vez, e única até hoje, que vi um pastor a conduzir uma manada de carro. E foi preciso ir a Espanha!


(O autor, todas as Quintas-feiras, no Blogue do Papa Léguas Portugal, emite uma opinião sobre assuntos relacionados com o autocaravanismo (e não só) – AQUI)



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