Imagem do Blogue do “Museu da Imprensa”
40 ANOS SEM CENSURA (?)
Há quem suponha que com o 25 de Abril de 1974 deixou de
haver censura em Portugal.
É verdade que a Comissão de Censura só foi oficialmente
extinta em 17 de Dezembro, cerca de 8 meses depois do 25 de Abril, há
exactamente 40 anos.
Desenganem-se, contudo, os que deduzem que com a extinção
oficial da Comissão de Censura deixou de haver censura em Portugal. A luta pela
Liberdade de expressão tem de ser uma constante diária sob pena de voltarmos ao
24 de Abril.
É que outro tipo de censores andam por aí e exercem outras formas de censura sob os
mais diferentes pretextos.
Eu que o diga!
FADO DA CENSURA
Neste campo
da Política
Onde a Guarda
nos mantém,
Falo,
responde a Censura,
Olho, mas não
vejo bem.
Há um campo
lamacento
Onde se dá
bem o gado;
Mas, no ar
mais elevado,
Na altura do
pensamento,
Paira um
certo pó cinzento,
Um pó que se
chama Crítica.
A Ideia fica
raquítica
Só de sempre
o respirar.
Por isso é
tão mau o ar
Neste campo
da Política.
Às vezes,
nesta planura,
Só o vento
sopra do Norte,
O pó torna-se
mais forte,
E chama-se
então Censura.
É um pó de
mais grossura,
Sente-se já
muito bem,
E a Ideia,
batida, tem
Uma impressão
de pancada,
Como a que
dão numa esquadra
Onde a Guarda
nos mantém.
O pó parece
que chove,
Paira em
todos os sentidos,
Enche bocas e
ouvidos,
Já ninguém
fala nem ouve.
Se a minha
boca se move,
Logo à
primeira abertura
A enche esta
areia escura.
Só trago e me
oiço tragar.
É uma
conversa a calar.
Falo,
responde a Censura.
Vem então
qualquer vizinho,
Dos que podem
abrir boca;
No braço,
irado, me toca,
E diz, «Não
vê o caminho?
O seu dever
comezinho
De patriota
aí tem.
Vê o caminho
e não vem?!»
Para isso,
boas aos molhos!
Se este pó me
entrou pròs olhos,
Olho, mas não
vejo bem.
(Fernando
Pessoa)
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