OS TREZE ANOS
(Cantilena)
Já tenho treze anos,
Que os fiz
por Janeiro:
Madrinha,
casai-me,
Com Pedro
gaiteiro.
Já sou
mulherzinha;
Já trago
sombreiro;
Já bailo ao
domingo
Co’as mais no
terreiro.
Já não sou
Anita,
Como era
primeiro,
Sou a senhora
Ana,
Que mora no
outeiro.
Nos serões já
canto,
Nas feiras já
feiro,
Já não me dá
beijos
Qualquer
passageiro.
Quando levo
as patas,
E as deito ao
ribeiro,
Olho tudo à
roda
De cima do
outeiro,
E só se não
vejo
Ninguém pelo
arneiro,
Me banho
co’as patas
Ao pé do
salgueiro.
Miro-me nas
águas
Rostinho
trigueiro,
Que mata
d’amores
A muito
vaqueiro.
Miro-me olhos
pretos
E um riso
fagueiro,
Que diz a
cantiga
Que são
cativeiro.
Em tudo,
madrinha,
Já por
derradeiro
Me vejo mui
outra
Da que era
primeiro.
O meu gibão
largo
D’arminho e
cordeiro
Já o dei à
neta
Do Brás
cabaneiro,
Dizendo-lhe –
Toma
Gibão
domingueiro,
D’ilhoses de
prata,
D’arminho e
cordeiro.
A mim já me
aperta,
E a ti te é
laceiro;
Tu brincas
co’as outras,
E eu danço em
terreiro.
Já sou
mulherzinha,
Já trago
sombreiro;
Já tenho
treze anos,
Que os fiz
por Janeiro.
Já não sou
Anita,
Sou a Ana do
outeiro;
Madrinha,
casai-me,
Com Pedro
gaiteiro.
Não quero o
sargento,
Que é muito
guerreiro,
De barbas mui
feras,
E olhar
sobranceiro.
O mineiro é
velho;
Não quero o
mineiro:
Mais valem
treze anos
Que todo o
dinheiro.
Tão pouco me
agrado
Do pobre
moleiro,
Que vive na
azenha
Como um
prisioneiro.
Marido
pretendo
De humor
galhofeiro,
Que viva por
festas,
Que brilhe em
terreiro.
Que em ele assomando
Co’o
tamborileiro,
Logo se
alvorote
O lugar
inteiro.
Que todos
acorram
Por vê-lo
primeiro;
E todas
perguntem
Se ainda é
solteiro.
E eu sempre
com ele,
Romeira e
romeiro,
Vivendo de
bodas,
Bailando ao
pandeiro.
Ai, vida de
gostos!
Ai céu verdadeiro!
Ai Páscoa
florida,
Que dura ano
inteiro!
Da parte,
madrinha,
De Deus vos
requeiro;
Casai-me hoje
mesmo
Com Pedro
Gaiteiro.
(António Feliciano de Castilho – 1800-1875)
António Feliciano de Castilho, primeiro visconde de Castilho, (Lisboa, 28 de
Janeiro de 1800 — Lisboa, 18 de Junho de 1875) foi um escritor romântico
português,
polemista e pedagogo, inventor do Método
Castilho de leitura. Em consequência de sarampo perdeu
a visão quase completamente aos 6 anos de idade. Licenciou-se em direito na Universidade de Coimbra. Viveu alguns anos
em Ponta Delgada, Açores, onde
exerceu uma grande influência entre a intelectualidade local. Contra ele se
rebelou Antero de Quental (entre outros jovens
estudantes coimbrões) na célebre polémica do Bom-Senso e Bom-Gosto, vulgarmente chamada de Questão Coimbrã, que opôs os jovens representantes
do realismo e
do naturalismo aos
vetustos defensores do ultra-romantismo.
Fonte: Wikipédia - A enciclopédia livre
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